Insanity Records | Artista baiano Marepe mostra na Fundação Iberê a exposição "Um fio que ligue os mundos"

Marepe, as primeiras sílabas do nome de batismo Marcos Reis Peixoto, nasceu em 1970, na pequena Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo Baiano. A cidade conecta o sertão ao mar, sendo um importante eixo por onde passam as mais diversas mercadorias, de materiais de construção a alimentos. 

Quando criança, costumava voltar da escola e passar um tempo na Comercial São Luís, onde trabalhava seu pai. Na loja de materiais, brincava com bacias, cordas, latas, caixas de fósforos e outros itens banais do dia a dia. Ali revelava-se um artista visual.

Já adulto, ingressou no curso de Artes Plásticas na Universidade Federal da Bahia (UFBA), com quem vivia uma relação atribulada, e nunca concluiu a faculdade. Foram as memórias da infância que lhe abriram as portas no mercado da arte.

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São quase 40 anos de carreira e Marepe é mundialmente conhecido pela maneira inventiva com que se apropria de objetos e práticas culturais de sua terra natal, centrada em ready-mades. O termo, criado por Marcel Duchamp (1887-1968), designa um tipo de objeto, por ele inventado, que consiste em um ou mais artigos de uso cotidiano, produzidos em massa, selecionados sem critérios estéticos e expostos como obras de arte em espaços especializados como museus ou galerias de arte. A irreverência e o senso de humor compõem o produto final.

Agora, Marepe atravessa o Brasil para apresentar na Fundação Iberê, a partir de 23 de agosto (sábado), sua primeira exposição individual na capital. Com curadoria de Ricardo Sardenberg, o conjunto de 21 obras criadas entre 1995 e 2024 evoca poeticamente uma memória pessoal que se entrelaça à sua cidade natal. Tudo vem da terra onde ainda vive, do convívio com seus habitantes, vizinhos e familiares. Está à venda nas lojas da pacata Santo Antônio? Virou arte: assadeiras, bacias, latas, carrinhos de obra, tijolos, mesas de plástico, madeira e papelão. Ou como ele mesmo diz, suas obras estão prontas, mas são invisíveis para as pessoas. 

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Segundo Sardenberg, “A obra de Marepe não se inscreve simplesmente no espaço da representação; ela age sobre a percepção, desestabilizando os códigos estéticos e as categorias instituídas pela modernidade eurocentrada. Escadas, bacias, carrinhos de feira – longe de funcionarem como alegorias identitárias – operam como agentes formais que reorganizam o campo do sensível. Marepe faz com os objetos cotidianos o que os construtivistas faziam com a linha e o plano: desnaturaliza-os, interrompe seu fluxo utilitário e os reintroduz no campo do significante, agora como enigma.”

No catálogo da exposição, o curador enfatiza: “É nesse novo ecossistema material que a obra de Marepe encontra sua força crítica. Ao recolocar em cena esses objetos – bacias, carrinhos, cadeiras, bicicletas, escadas, enfeites de natal – não como resíduos, mas como signos ativos de uma economia afetiva, o artista realiza uma torção semântica no gesto do ready-made. Se Duchamp retirava o objeto de seu contexto funcional para inseri-lo no circuito da arte, Marepe opera um movimento inverso: ele reinscreve o objeto artístico no campo do necessário. Por isso, em vez de ready-made, Marepe propõe, de forma jocosa, a ideia de necessáire – aquilo de que se precisa para viver. A arte, aqui, não está apartada da vida; ela se faz no entrechoque entre memória e precariedade, entre invenção e escassez, entre o local e o global – enfim, uma celebração do campo de visão de quem olha a partir do umbigo da periferia.”

Para Sardenberg, seria um equívoco situar Marepe apenas dentro da genealogia da escultura contemporânea ou da instalação. O que está em jogo em sua prática é uma reconfiguração das condições mesmas da arte, uma contestação silenciosa – mas não por isso menos incisiva – dos regimes de visibilidade que historicamente separaram o “popular” do “erudito”, o “regional” do “universal”. Como certos gestos duchampianos reterritorializados a partir do recôncavo baiano, seus objetos deslocam o familiar para o campo do estranho, do inquietante.

Sobre o curador

Ricardo Sardenberg é curador, editor e crítico de arte. Formado pela NYU, foi diretor das galerias Zabriskie, Nova York e Camargo Vilaça, São Paulo, além de atuar na Pinacoteca do Estado de São Paulo e em Inhotim. Fundou a Editora Cobogó, Rio de Janeiro e o Projeto Vênus, São Paulo, atual galeria Sardenberg. Curou exposições de artistas como Cildo Meireles e Wesley Duke Lee. Representou a Art Basel no Brasil por 15 anos.

SERVIÇO
Exposição “Marepe  Um fio que ligue os mundos”
Curadoria: Ricardo Sardenberg
Onde: Fundação Iberê (Avenida Padre Cacique, 2000 – Cristal)
Abertura: 23 de agosto | Sábado | 14h
Visitação: até 1º de março de 2026 | Quinta a domingo, das 14h às 18h (última entrada) | Às quintas-feiras, a entrada é gratuita

Contato com a imprensa: Roberta Amaral
51 99431 94.29 | imprensa@iberecamargo.org.br
Site: iberecamargo.org.br 
Instagram:@fundacaoibere

Foto:
Sérgio Guerini

Fonte:
Roberta Amaral

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